Mas eu nunca te esqueci...
Estou com meu coração amarrado em volta do cipreste, nas curvas do meu quintal e ainda não amanheci, apesar das horas...
Lembro que ainda guardo, mesmo que bem lá no fundo, uma centelha, uma faísca, que a qualquer momento pode causar combustão instantânea, se misturada aos gases que saem do meu pensamento. Não, ela não se foi. Parece que dormia, estava em coma, dopada, no calabouço em que a pus para continuar a viver meus dias em paz. Não, ela não me dava a paz, mas que paz me preencheria, se longe daqueles tais conflitos que viviam com ela, minha vida não esboçava emoção alguma?
Eu tremia e temia, não sabia desenvolver nada, tampouco lidar, porém tentava, insistia e não podia mais continuar. Se a guerra já estava perdida, para que então lutar? Eu era um soldado perdido, com fome, sem aliados, era desertora de uma batalha que se iniciou dentro de mim e eu nunca soube explicar como todo esse caos se originou...
Ela não tinha um belo olhar, não me ganhou com seu sorriso, suas palavras, seus versos, em nada lembravam poesias, ela era absolutamente sem graça, estranha, desinteressante, meu avesso em todos os sentidos, no entanto dentro dela tinha um livro sobre como me enlouquecer e devo dizer que ela havia decorado cada palavra do mesmo, pois até hoje, me vejo habitando manicômios emocionais...
Ela me enlouqueceu, não por seus predicados, não por sua decência, personalidade, pelo seu corpo, ou pelo pseudo-amor que nutrira por mim, mas ela me enlouqueceu, pois era louca e apreciava a loucura. Ela conseguiu incitar em mim a dependência pela violência, pelo despudor, pela fadiga, pela lamúria, pela sujeira, pela mentira. Eu e ela éramos fies residentes da mesma sarjeta e penetrávamos uma na outra como sanguessugas, nos alimentávamos uma do sangue da outra e ficávamos ausentes do mundo...
Ela tão ariana, com sua alma de marinheiro, facilmente podia e conseguia desprender-se de todo e qualquer sentimento conforme lhe fosse conveniente. Ela queria mais, muito mais do que eu tinha para lhe oferecer e como um retirante em um banquete, ela se lambuzou em mim, fartou-se e despediu-se, quando já estava virando a esquina...
Eu me recolhi, abracei os mil e oitenta e três pedaços meus que aos poucos caiam de mim e me juntei ao entulho da vida...
Eu tentei me procurar dias depois e só depois de três meses enfim, pude me ver novamente. Eu estava magra, na verdade estava desnutrida, incoerente, incrédula, amarga e incansavelmente sarcástica. Eis o sarcasmo, meu amido, meu alimento.
Ousei navegar em outros mares, atrevi-me a jogar-me em outros amores, experimentei, fui experimentada, gostei, fui gostada, fui desgostada e previsivelmente também fui machucada. Contudo era visível que o que eu trazia em meu peito, já era uma chaga aberta, apenas com uma casca, todavia o ferimento ainda estava ali, para quem quisesse ver...
Enquanto permaneci distraída, fui deixando no ostracismo a lembrança do véu, do pão, do céu, do mel dela, porém a verdade é que eu nunca me esqueci, apenas deixei-a guardada dentro de um baú, onde só eu poderia encontrá-la outra vez. Mas quem disse que há o interesse em resgatar um sentimento tão nocivo? Não há e não há mesmo! O que há é a imagem daquele rosto magro, sem graça, branco, daquela pele estranha, daquele olhar sem sal que apesar de não transparecer nenhuma qualidade instigante, me levou com ela e talvez ainda leve algo de mim que dorme e acorda, em sua cama, junto dela...
Não penso em voltar, em procurar, não penso em querer, mas preciso ou não entender o que sinto. A verdade é que gostaria de incinerar tudo isso de minha lembrança, mas não é tão fácil. O importante é que não mais me úlcera a saudade, o tempo, distância. Entretanto a pergunta que foi feita lá atrás e que até hoje não quer calar é: Quem é ela?
Ela não mora mais aqui e talvez tenha fugido de casa. Tentei alcançá-la, mas meus passos foram em vão. Senti seu perfume caro embriagando meu rosto, deslizando sobre minhas costas como uma corrente de ar que assedia o corpo daqueles que são sensíveis como eu...
Não, eu não gosto mais dela e não, também não a amo e nem a amei, o amor passa léguas longe de mim e do que vivemos, todavia quem disse que eu me importo? Não quero uma alcunha para batizar este sentimento que me assombra, me espreita, sussurra em meus ouvidos e diz aquele nome, o nome que não posso dizer, pois habita meu subconsciente e me faz citá-lo a cada minuto. O nome dela é...
Ela nunca vai saber o que tenho embalado aqui, a cor que tem, seu odor, como fica na primavera, no outono, no inverno, só vai saber que no verão explode, queima e cozinha minha mente a ponto de me derreter completamente.
Eu sei que eles não dizem, pois nunca disseram nada, no entanto eu ainda sonho com aqueles olhos pequenos, com aquela face estranha que tanto fez sentido pra mim, mesmo quando me matava de dor e me refiro a todas as dores...
O que afinal posso dizer é que seja quem for agora, ela foi a única mulher que me matou, mas me matou de prazer...
"(...) Eu vivi a esperança e você fugiu de mim....
Dois caminhhos diferentes, é a vida que é assim...
Mas eu nunca te esqueci..."
quinta-feira, 28 de junho de 2012
terça-feira, 26 de junho de 2012
A mulher da massa.
A gente ainda vai se encontrar muitas vezes, mas eu só te enxergarei
mais uma vez, não será para me despedir, nem pra me lamentar, mas sim, para
encerrar esse capítulo nefasto em minha vida, que você teve o prazer de
assinar. Não, você não serve nem para ser um fantasma, não tem recursos,
competência, sequer inteligência suficiente para me atormentar. Você foi nada mais
que um corpo que comi na sobremesa, repeti algumas vezes e que azedou em meus
lábios, me causou azia, gastrite, por fim te vomitei e agora posso voltar a ter
apetite outra vez. Alguns venenos são bons, mas os mais baratos como você, só
fazem estrago breve...
Lembro do seu gosto, do seu cheiro e os associo a um vinho barato, um
perfume vagabundo, que depois de certo tempo dão dor de cabeça, aquela ressaca,
que no meu caso se fez ressaca emocional. Devo me culpar pela minha
ingenuidade, pela minha indulgência, me embriaguei fácil demais em um
líquido tão vulgar, tão popular entre as multidões. Você é a mulher da massa,
que o povo gosta, desgosta e se deleita e o que eu aprendi nesses quase seis
meses em que estive sob o domínio de suas correntes enferrujadas, foi que eu me
tornei parte da massa, me igualei a você, aos seus fãs. Logo eu que sempre fui
alternativa, diferente, absolutamente atípica, acabei simplificando minha forma
de ver a vida, para que entre nós não fosse necessário um léxico, e assim, não
houvesse a distração...
Eu me distraí, eu me deixei levar pelo relevante prazer que me foi
proporcionado por você, deixei a minha vaidade me guiar, fechei meus olhos e
caminhei ao lado de um parasita que me sugou de todas as formas que pôde e nem
sequer soube se despedir, apenas deixou que eu lhe extirpasse de meu corpo,
para que novamente pudesse voltar a plenitude da vida em cores...
Perdi a naturalidade, misturei lembranças de outros carnavais,
outras colombinas e eu como sempre terminei
como um pierrot apaixonado e febril, assistindo a colombina sumir nos braços
dos mais de mil arlequins... Na quarta-feira de cinzas, junto com os restos
mortais da festa da carne, eu encontrei meus pedaços junto aos confetes,
serpentinas e demais corações partidos. Sua lembrança me cercou por todos os
cantos da avenida e o pior é que eu não senti nada, apenas um vazio estranho
que dentro de mim fez um eco e dizia: "Iara covarde..."
Meu coração se apegou a um alguém tão covarde, que
se perdeu entre suas próprias penas e hoje cisca em vários galinheiros...
Consigo perdoar as grandes falhas, os grandes erros
da humanidade, mas ainda não aprendi a lidar com a covardia. Entendo que há
quem se acovarde por medo de machucar aos outros, de se machucar, mas quando a
covardia é apenas com o intuito de zelar e de estender a vaidade, para que a
reputação permaneça intacta, é absolutamente nauseante. Não respeito quem me
fere, para se manter de pé, aquele que não preza o sentimento dos outros,
merece ser desprezado. A covardia fede, exala miasma, e a latrina é a boca de
quem não consegue ser mulher, não consegue ser gente, ainda não deixou de ser
coliforme fecal, contamina e faz mal as pessoas com quem tem contato, mas estou
me curando, ou já me curei, não sei!
É leviano o coração de uma mulher que imaturamente ainda não soube amar,
ainda não cresceu, é menina, mas causa a mesma destruição que vinte mil
soldados causariam em uma guerra e posso dizer que preferiria ser atingida em
cheio no peito, na cabeça, a ser feita prisioneira ou me esconder pela
eternidade em trincheiras... Não nasci pra me esconder, sequer recuar. Bandeira
branca, só se houver acordo e dignidade entre ambas as partes, mas sabemos que
essa teoria é meramente utópica. Não há nada de nobre e nem de digno em olhos
tão vis...
Não há nada de bom ou de ruim para lhe desejar, apenas um carma que lhe
caiba e lhe vista bem, para que ali adiante todo o sangue derramado por
todas aquelas que lhe foram devotas, não seja em vão.
Deixo minhas palavras que perpetuarão como um pergaminho, que de tanto
vagar por aí, chegará às mãos e aos olhos daqueles que precisarão absorver
essas ideias, a textura do meu eu e do que sinto.
Faço da minha vida, do meu corpo, do meu espírito, uma morada de
paz, sossego e luz, para que seres rastejantes e demoníacos da noite, não mais
me enxerguem. Estou me livrando das trevas, estou enfim acendendo a luz e quero
voltar a dormir para sonhar com intermináveis dias de sol, onde os sorrisos
sinceros abençoarão minha alma...
Ainda há esperança, só não há mais a inocência...
C'est fini
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